segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Educação dada a seu filho

Dª Lucilia nota mudança de situação do filho
Desde a infância de Dr. Plinio, Dª Lucilia desejava o desenvolvimento e a irradiação da personalidade dele e entrevia que, de algum modo, esta atingiria grandes proporções. Suas esperanças quanto ao invulgar futuro do filho, alimentadas por sua intuição de mãe, em parte haviam-se realizado quando ele, ainda moço, tornara-se líder das Congregações Marianas e do próprio Movimento Católico.
Entretanto, insondáveis são os superiores desígnios da Providência Divina, que sói permitir pesadas provações para aqueles aos quais ama e que tanto Lhe devotam o melhor de suas vidas. Não foi diferente com Dr. Plinio e sua querida mãe. Esta, havendo seguido passo a passo a brilhante ascensão de seu filho, começou a assistir penalizada a uma maré-montante de dificuldades que lhe perturbaram tanto a vida apostólica quanto a profissional.
À lista de dissabores acrescentavam-se ainda danos econômicos de monta, devidos não só à perda de seus melhores clientes, como também a uma lei de inquilinato que prejudicava a fundo os direitos dos proprietários de imóveis de aluguel, como era o caso de Dr. Plinio. Ao longo de várias conversas com sua mãe, ele ia-lhe narrando o que sucedia, descrevia suas vicissitudes, bem como as consequências daí decorrentes para a existência de ambos.
Com resignação cristã, mediu ela as consequências desses fatos em sua situação pessoal. Antes era a mãe daquele que fora o mais jovem e mais votado deputado do Brasil, pólo de pensamento da opinião pública católica e até da não-católica; daquele idealista diante de quem se abrira a perspectiva de brilhantes vitórias, até o triunfo final da Igreja sobre os seus inimigos. Agora se tornava a mãe de um homem ao qual o sucesso havia voltado as costas, e que passava a viver quase completamente isolado.
Porém, a Dona Lucilia um consolo restava, e isso era o mais importante: fosse no apogeu do prestígio ou em meio à contrariedade, seu querido “filhão” continuava sempre o mesmo.
“Não há o que quebre o Plinio”
Outro sofrimento afligia Dona Lucilia: nada poder fazer em favor de seu filho, a não ser auxiliá-lo por meio da oração. No entanto, alguns fatos que de vez em quando lhe chegavam aos ouvidos, por esta ou aquela pessoa conhecida, enchiam-na de consolação, pois lhe revelavam como, no meio de tantas tribulações, nada abatia o ânimo dele.
Um dia, por exemplo, Dr. Plinio voltava de balsa, em companhia de seu cunhado, Antônio de Castro Magalhães, de Guarujá para Santos, com destino a São Paulo. A pequena distância deles estava sentado um casal, do maior realce na sociedade paulista da época. Reconhecendo-o, sorriram com amabilidade, dando mostras de querer entabular com ele uma conversa Dr. Plinio de há muito conhecia o marido, mas jamais fora apresentado à esposa, razão pela qual julgou mais atencioso não tomar a iniciativa de procurar o casal para o saudar pessoalmente. Essa atitude de reserva, julgou dever conservá-la ainda quando a esposa se pôs também a cumprimentá-lo, de modo amável. Foi por isto que ele permaneceu no lugar em que se achava, em conversa com seu cunhado.
A dada altura, o marido não se conteve mais e, deixando a esposa a sós, levantou-se e foi alegremente falar com Dr. Plinio. A gentil atitude do eminente casal deixava ver como se mantinha intacto na sociedade paulista o prestígio do intrépido batalhador.

Antônio notou bem o que havia de reservado na cortesia de Dr. Plinio e, ao encontrar-se depois com Dona Lucilia, narrou-lhe esse pequeno episódio. Quando, à noite, ela esteve com seu filho para a habitual “prosinha”, o tema foi este. Cheia de contentamento, ela então lhe contou o comentário do genro: “Não há o que quebre o Plinio!”
(Transcrito, com adaptações, da obra “Dona Lucilia”, de Mons. João S. Clá Dias)

segunda-feira, 16 de setembro de 2013

Nos cuidados da própria saúde, preocupação com os filhos

O precário estado de saúde de Dª Lucilia causava constante apreensão a seus filhos, e os levava a não pouparem esforços nem recursos a fim de aliviá-la — o quanto estava ao alcance deles — da penosa enfermidade de fígado que a acometia. Por tal motivo nunca deixaram de lhe proporcionar longas permanências em Águas da Prata, que resultavam em sensíveis melhoras para ela.
Porém, na sinceridade de seu desprendimento, mais preocupada com os outros do que consigo mesma, Dª Lucilia não queria pesar no orçamento deles. Receava fazerem excessivos gastos com ela e, como se pode comprovar por uma afetuosa resposta de Dr. Plinio, chegou a externar isso numa de suas cartas, infelizmente perdida:
 Santos, 27 de março [de 1942]
Mãezinha,
Recebi sua ultima carta, da qual lhe devo dizer francamente que, se uma parte me agradou muito, a outra não me desagradou menos.
Agradou-me muito, é claro, saber que a Sra. está, graças a Deus, passando melhor.
No entanto, a forma pela qual a Sra. se refere ao interesse que Rosée e eu tomamos por sua saúde, me desagradou categoricamente. Em tudo, meu bem querido, é preciso ser lógico. Em primeiro lugar, o que Rosée e eu estamos fazendo não passa de trivialidades, certamente feitas com grande afeto, mas que nem por isto deixam de estar na órbita das trivialidades. O que de mais natural do que ela levar a Sra. para a casa, e lá lhe dispensar todo o carinho? Pois não é sua filha? O que é ser filha? De minha parte, o que de mais vulgar do que empregar algum dinheiro para o bem-estar de minha Mãe? Se o dinheiro que, com o auxílio de Nossa Senhora, tenho podido ganhar, não se empregasse com suma satisfação neste assunto, mereceria eu o castigo de que ele me fugisse inteiramente das mãos, pois que, gastando-o assim, outra coisa não faço senão dar cumprimento a uma obrigação grave, cuja observância de minha parte é destes “minimuns” que se exigem de qualquer pessoa de sentimentos vulgarmente bem formados.
Por outro lado, ainda que o sacrifício fosse de monta, sendo feito para a Sra. estaria idealmente bem, e não poderia estar melhor. Se eu precisasse da Sra. um sacrifício pesado, pedi-lo-ia e aceitá-lo-ia com tão absoluta naturalidade, com tal certeza da inteira dedicação com que a Sra. o prestaria, que nem me ocorreria fazer lamentações sobre o caso. Não sei por que a Sra. ha de imaginar que a recíproca não deve ser a mesma......
Assim, meu bem, nada de lamúrias, de lamentações, de agradecimentos. Agradeça simplesmente a Deus e a Nossa Senhora que tenhamos com que fazer face às necessidades, e lhes peça que continue a ser sempre assim. Quanto ao mais, o assunto está definitivamente encerrado, ouviu meu bem?
A seguir, a carta nos coloca uma vez mais ante a perspectiva da Segunda Guerra Mundial, na qual o Brasil acabara de se envolver. De fato, após ter mantido, junto com o bloco maciçamente católico de nações latino-americanas, uma tal ou qual neutralidade, nosso País entrou na guerra quando a opinião pública de modo definido se decidiu contra o nazismo. Solidário com os Estados Unidos, que acabavam de sofrer o ataque de Pearl Harbour (7 de dezembro de 1941), o Brasil rompeu relações diplomáticas com os países do Eixo.
A propósito dos novos panoramas, Dr. Plinio comentava na mesma carta:
[Imagino que contaram] à Sra. o excelente passeio que fizemos ao forte Munduba. Estava muito impressionante a sensação de, em pleno território nacional, nos encontrarmos em uma autêntica “maginot” escavada dentro da própria rocha, e conversar-se sobre descida possível de paraquedistas, a eventual chegada de esquadras estrangeiras, a ação da quinta coluna em Santos, etc., etc. É um novo capítulo que se abre, uma nova era em que se entra, na História nacional. Em outros termos, começamos a ser “gente”, a correr riscos, a tratar de coisas sérias, e a impuberdade política em que nossa situação geográfica e nossa debilidade nos colocavam, parece ter cessado de vez. Assim se abre o capítulo: como se encerrará? Qual será o mapa do mundo, quando isto tudo amainar? É o que só Deus sabe.
Devo chegar terça-feira, não sei bem a que horas, mas certamente depois do almoço. Aí mataremos, se Deus quiser, as saudades que estão até rendendo juros, de tão grandes.
Papai já deve ter chegado. Mande-lhe um apertado abraço. Para a Sra., meu bem querido, muitos e muitos beijos e abraços do filho saudosíssimo, que lhe pede respeitosamente a bênção.
Plinio
Na solidão de seu quarto, Dª Lucilia deve ter lido e relido inúmeras vezes essas linhas, consolada por lhe haver dado Deus um filho tão dedicado e generoso...

(Transcrito, com adaptações, da obra “Dona Lucilia”, de João S. Clá Dias)

segunda-feira, 9 de setembro de 2013

A presença repousante de Dª Lucilia

Os encargos do escritório de advocacia somavam-se às diversas outras tarefas que Dr. Plinio já desempenhava. Com efeito, além de exercer o magistério e de ser diretor de uma imobiliária, entregara-se de alma inteira à atividade apostólica, que muito o absorvia.
A justa nomeada que alcançara como líder católico obrigava-o a comparecer a grande número de atos públicos nos meios religiosos, sendo com freqüência convidado a fazer discursos e conferências nos mais variados ambientes.
Apesar de tão intensos trabalhos, nunca saía de casa sem antes se despedir de Dª Lucilia e de lhe dizer aonde ia. Ela o abraçava, beijava e depois lhe dava a bênção. Certo dia, porém, Dª Lucilia notou que Dr. Plinio saíra sem dela se despedir. Apenas encontrou, em local visível, um bilhete, encimado por uma pequena cruz sob a qual se liam as iniciais do lema de Santo Inácio: Ad Majorem Dei Gloriam.
Mãezinha de meu coração, Há perto de três semanas, marquei para hoje à noite, às oito e meia, uma conferência na Escola Paulista de Medicina, na Vila Clementino.
Depois esqueci-me da data. Ontem me telefonaram lembrando. E eu lá vou com grande antecedência (...).
Por isto, meu amorzinho, lhe deixo mil e mil dos mais saudosos beijos, pedindo-lhe desculpas, e prometendo voltar logo que termine, para matar as saudades.
Em outro dia ocorreu o contrário. Dr. Plinio não aparecera de manhã, à hora habitual, para dizer a ela bom dia. O tempo passava e ele não dava qualquer sinal de vida. Dona Lucilia mandou a empregada verificar o que ocorria não demorou: a porta do quarto estava fechada e tudo permanecia em silêncio. Desta vez, não era nenhuma doença que o prostrara na cama, mas o cansaço por uma vida muito atarefada. Ela disse então à criada que batesse na porta e passasse por baixo um bilhete, que escreveu, com o seguinte apelo:
Plinio,
Você já perdeu a aula, vê se não perde também o emprego! Levanta-te já, peço-te.
Na verdade, a fadiga que alquebrava Dr. Plinio não era só, nem principalmente, fruto dos muitos trabalhos, mas sim das incontáveis batalhas em defesa da Fé. Porém, se o combate levado a cabo com entusiasmo lhe pesava nos ombros, a simples presença de sua mãe compensava tudo, constituindo um bálsamo de suavidade. Sentia-o de modo especial quando chegava a casa, vindo do escritório, ocasião em que lhe era mais patente o choque entre o frenesi da rua e as bênçãos do lar.
Passava Dª Lucilia boa parte do dia rezando ou lendo, sentada na cadeira de balanço outrora pertencente a Dª Gabriela. Ao seu redor se criava uma atmosfera de indizível tranquilidade, o oposto do mundo agitado e tormentoso que se movia fora de casa. Era como se uma campânula invisível, colocada por um anjo, protegesse aquele ambiente do conturbado torvelinho da vida. Quem nele penetrasse, sentia a alma pervadida pela paz. Uma paz mais repousante que duas ou três horas de descanso...

(Transcrito, com adaptações, da obra “Dona Lucilia”, de Mons. João S. Clá Dias)

domingo, 1 de setembro de 2013

Demora preocupante

Os acontecimentos da Europa, convulsionada pela Segunda Guerra Mundial, alimentavam o fervilhar das polêmicas no Brasil. Das páginas do “Legionário”, Dr. Plinio fazia a tribuna, do alto da qual desafiava os inimigos da Igreja.
Dona Lucilia, que seguia com olhar atento as atividades de seu filho, bem avaliava os perigos pelos quais ele passava. Numa ocasião em que os ânimos estavam mais acirrados, Dr Plinio chegou a ser ameçado de morte. Por isso, à noite, Dª Lucilia nunca se deitava antes de seu filho ter chegado em casa. Quando ele demorava mais do que o habitual, com certa aflição despertava Dr. João Paulo e, para movê-lo a tomar alguma medida, lhe perguntava:
— Plinio não está demorando?
Como bom nordestino, mais dado ao otimismo e à despreocupação, o marido procurava sossegá-la dizendo:
— Senhora! ele chega a qualquer momento.
Esse otimismo, graças certamente às fervorosas orações de Dª Lucilia, nunca foi desmentido pelos fatos, naquelas circunstâncias.
Porém, a bonomia de seu esposo não era suficiente para tranquilizá-la, e ela replicava:
— Não!... Ninguém sabe o que pode acontecer...
E continuava a rezar, confiante na proteção da Providência. Às vezes, quando a saúde o exigia, recostava-se na cama e mantinha a luz acesa, esperando que o ruído dos passos firmes de seu filho anunciasse o fim da vigília. Depois que Dr. Plinio a cumprimentava e ela verificava com os próprios olhos a integridade física dele, se o tempo ainda o permitisse, iniciava uma pequena prosa para saber novidades do dia, como havia corrido o trabalho, o apostolado...
Dr. João Paulo, a fim de convencer seu filho a chegar mais cedo, contava-lhe, por vezes, os temores de Dª Lucilia com aquelas demoras. Porém, para Dr. Plinio as obrigações para com a Causa da Igreja tinham precedência, e em nada permitiam mudar seus horários. Dona Lucilia compreendia bem que isto não podia ser de outro modo e nunca se queixava, oferecendo pelo esposo e pelos filhos, ao Sagrado Coração de Jesus, o sacrifício que aquela situação representava.
Uma noite, porém, as horas foram escoando e Dr. Plinio não aparecia. Sempre que poderia ocorrer algum atraso, ele prevenia sua mãe. No entanto, naquela noite não recebera ela qualquer aviso. Bem podemos imaginar quantas e quão sombrias conjecturas passaram pela mente de Dª Lucilia. Teria ocorrido algum acidente com seu filho, ou sofrera ele algum atentado? Como sempre fazia nas ocasiões de angústia, recorreu ao Sagrado Coração de Jesus e, aos pés da imagem do Divino Redentor, ora sentada, ora em pé, lá foi desfiando com serenidade e confiança as contas do rosário.
Quando as primeiras claridades da aurora começaram a afugentar as trevas, cerca das cinco da manhã, Dr. Plinio afinal chegou. Ainda não terminara ele de dar a volta completa à chave na fechadura e já Dª Lucilia se dirigia ao hall de entrada para o receber. Às angústias da longa espera, sucederam-se as alegrias de o ver ali são e salvo. Por isso mesmo, antes de lhe fazer qualquer pergunta, recebeu-o com carinho. Após os primeiros instantes de evidente alívio, perguntou-lhe:
— Mas, meu filho, o que você fez até agora?
Dr. Plinio explicou-lhe o motivo de tão prolongada demora: dois religiosos para cuja Ordem advogava foram naquela noite ao seu escritório para tratar de alguns assuntos. A Ordem à qual pertenciam era um de seus melhores clientes. Como os padres apreciavam uma boa prosa, terminada a consulta, iniciaram uma conversa que se prolongou até as quatro e meia da manhã.
Dona Lucilia, ainda um pouco inconformada, replicou surpresa:
— Mas, padres, até essa hora na rua!?
— Sim, senhora. E era minha obrigação atendê-los. Se não fosse por outras razões, boa parte de minha advocacia depende deles.

Tranquilizada pela explicação, Dª Lucilia resolveu ir se deitar, não sem antes agradecer ao Sagrado Coração de Jesus por nada de grave haver acontecido.