quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Voz com inflexões suaves e tons profundos

A arte de educar consiste em formar a criança fazendo com que veja o lado razoável da autoridade, o aspecto bonito da hierarquia, a fim de amar ser mandada, obedecer. Assim, ela se torna amiga da Contra-Revolução em vez de ficar amiga da Revolução.
A atitude de Dona Lucilia em face desse problema era a seguinte:
Sua voz, embora não fosse de cantora, era muito agradável para conversa, cheia de inflexões. E inflexões muito suaves, doces, que correspondiam aos movimentos do temperamento dela, e diziam o que queriam dizer. Por causa disso tinha também tons muito graves, profundos, que não eram de pito, mas para fazer ver a gravidade, a seriedade do que ela estava dizendo. O temperamento dela era capaz de uma grande seriedade e, falando, ela normalmente tomava muito a sério tudo aquilo que ela dizia. E, quando mencionava qualquer autoridade, ela falava com certo respeito e tinha um modo de entoar a voz, fazendo-nos sentir por que e de que jeito aquela autoridade era respeitada.
Veneração para com o sacerdócio
Por exemplo, o modo de mamãe, Dona lucilia, se referir a um padre. Meu pai tinha um primo-irmão que era sacerdote; chamava-se Cônego Luís Cavalcanti. Homem muito inteligente, ele ficara solteiro até tarde e, em determinado momento resolveu ficar padre e ordenou-se na Arquidiocese do Rio de Janeiro.
Ele mantinha muito boa conversa e às vezes vinha a São Paulo, sendo então convidado à nossa casa para almoçar ou jantar; compareciam também parentes de minha mãe para ouvir as palavras desse primo de meu pai. E faziam bem, porque ele era sacerdote e sustentava discussões com alguns meus tios, que eram ateus. Nessas discussões ele serrava de cima pela sua cultura, inteligência, com certa polidez e amenidade. De maneira que esses tios incrédulos até gostavam de entregar os pontos e davam risada; o padre, quando os encostava na parede, também ria de um modo amável; e aquilo tudo constituía uma conversa muito afável. Porque era muito menino, eu não entendia bem os temas das discussões, mas gostava de observar o jogo das fisionomias, os tons de voz, as atitudes das pessoas.
Minha mãe tinha um irmão muito inteligente, o qual fazia para o sacerdote perguntas muito provocantes. Eu olhava para o padre e pensava: “Dessa vez parece que ele está na parede.” Ele ouvia com toda a calma e dizia: “O senhor sabe, isto precisa ser visto num enfoque diferente”; o sacerdote mudava a questão, colocava-a no ponto certo e meu tio levava o tiro.
Quando Dona Lucilia falava desse parente, nunca o fazia sem uma inflexão de voz para dar a entender que, além de ser um primo do marido dela — portanto, primo dela também —, era um padre da Igreja Católica. Ela jamais dizia “o primo Luís”, mas “o Padre Luís”; e, posteriormente, quando ele ficou cônego, “o Cônego Luís”. No modo de ela dizer “Padre Luís” ou “Cônego Luís”, as palavras padre e cônego tomavam uma inflexão de voz que exprimia toda a sua veneração pelo homem superior a ela porque era consagrado a Deus.
Por causa disso, ela possuía para com ele solicitudes, atenções, que não tinha para com parentes muito mais ricos. Esse padre não era rico, mas isso para ela não queria dizer nada. Realmente, em se tratando de um sacerdote, isso não importa; ele é um ministro de Deus.
O modo de mamãe dizer “padre”, de se referir a ele, de tratá-lo, as atenções especiais para com ele, o verdadeiro afeto, porque, além de ser um parente, era um sacerdote, fazia a criança aprender o que era um padre, antes de compreender a doutrina católica sobre o sacerdócio. Dessa forma, o coração ficava pronto para receber o que a Fé haveria de dizer depois, pelo ensinamento da Igreja.
Plinio Correa de Oliveira - Extraído de conferência de 13/3/1993

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